quarta-feira, 27 de janeiro de 2010
Era uma vez uma lebre, alva, em Inaba
Era uma vez uma lebre, alva, em Inaba
Sua carne crua, sua pele descorada
Carregando um grande saco no ombro
O velho deus da colheita se aproximou da chuva
E lá ele viu a pobre lebre alva de Inaba
Sua carne crua, sua pele descorada
E com pena da pobre lebre
O deus a ensinou a se lavar na água cristalina
E a se enrolar num algodão também alvo
Foi o que o velho deus da colheita lhe ensinou
A lebre então lavou-se na água cristalina
E enrolou-se num algodão alvo e macio
E assim voltou a ser uma lebre alva
Quem será o velho deus da colheita?
(do ainda não do kurosawa)
Sua carne crua, sua pele descorada
Carregando um grande saco no ombro
O velho deus da colheita se aproximou da chuva
E lá ele viu a pobre lebre alva de Inaba
Sua carne crua, sua pele descorada
E com pena da pobre lebre
O deus a ensinou a se lavar na água cristalina
E a se enrolar num algodão também alvo
Foi o que o velho deus da colheita lhe ensinou
A lebre então lavou-se na água cristalina
E enrolou-se num algodão alvo e macio
E assim voltou a ser uma lebre alva
Quem será o velho deus da colheita?
(do ainda não do kurosawa)
sábado, 23 de janeiro de 2010
Era mais um concerto, e faltava dez minutos.
Era mais um concerto, e faltavam dez minutos. Os textos na língua materna serviam de vacina. Dez minutos dali, ele estaria imerso a língua que tanto lhe prendia a língua, preso a essa desconhecido pelo decorrer de uma hora.
Mas os poemas lidos par hasard (já sortiam os primeiros efeitos da vacina) lhe cansavam. Os anticorpos galícios então lançaram
- On aime beaucoup les files ici, à France, non?
A senhora sorriu, se aproximou de um banco e pediu perdão.
- Les français, tous les français aiment bien être sur les files. Au Brésil, je pense qu'il n'y a pas les files comme ici.
A senhora continuou sorrindo, e ele sabia que ela concordava, em sua língua, mas os novos anticorpos deram apenas conta de reconhecer a pergunta fina, e você vem da Inglaterra?
Sorriu. Finamente não o consideravam espanhol ou, pior, mexicano.
- Oh non, je suis brésilien.
A velha senhora sorriu exclamando que nutria uma grande admiração pelo Brasil. Lá vem o papo da Amazônia, do calor e do bundalelê, pensou.
- Você sabe, ele é muito importante na minha vida, o Lulá, disse a sorridente, num sotaque particular.
Com tal surpresa, ele também sorriu. E sorrindo, eles versaram sobre a política, mas os dez minutos se passaram e a senhora disse, por último, já ao se levantar, Sarkozy, ele sim é um tolo. E ela não sorria mais.
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Na hora seguinte, surpreendido pela execução, não na origem do Tintin nem na do Milu, mas sim naquela proveniente do cáucaso (cuja vacina, era notável, ele não havia tomado), ele sorriu em alguns momentos. Não ria, porém, do contágio daquele novo organismo fonético, mas sim por perceber que nascera dotado dos mesmos sensos comunicativos que eles (os que, como Obelix, haviam caído no caldeirão da língua gaulesa quando ainda bebês e assim falavam coucou e bonjour e horloge et enfin).
A moça pulava da poltrona e ria, olhando para a outra moça à cotê em todos os três efes subitamente perfomáticos. Já a outra, se s'apercebia da grande variação de pressão sonora advinda do pequeno palco, pouco ou mal se surpreendia, apaixonada que estava pelo moço assentado na fileira do g de gato, de gateau, número treze, do treze de lula.
Uma outra senhora (a notar: bastante menos confiante da vida, e, por isso, menos sorridente) atraía também os olhares da garota, mas não se tratava de paixão, ou talvez pelo silêncio humano que devia reger a platéia concertal. Logo na seção mais silenciosamente musical da peça, um ataque de tosse atacava a pobre saúde da velha. E ela, decerta de sua derrota, descofiante que estava da sua saúde, procurava as pequenas balas verdes indicadas pelo farmacêutico, o qual não havia suposto que a embalagem metálica poderia causar tantos desorrisos.
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Se sou contra a afetação, é simplesmente porque antes do que chamam de arte, eu amo a vida.
terça-feira, 19 de janeiro de 2010
Eu ainda vou encontrar.
Eu ainda vou encontrar. Quando você dirá a ele?
Alguém ligou?
Que horas são?
Eu tenho um segredo. levanta
Ninguém ligou. senta
Eu não sei. Uma coincidência. ri
Não se esqueça que hoje é sexta. Quando foi?
Eu ouvi alguém.
Eu queria te dizer uma coisa, Susie. levanta
sai
(coelhos do David Lynch)
Alguém ligou?
Que horas são?
Eu tenho um segredo. levanta
Ninguém ligou. senta
Eu não sei. Uma coincidência. ri
Não se esqueça que hoje é sexta. Quando foi?
Eu ouvi alguém.
Eu queria te dizer uma coisa, Susie. levanta
sai
(coelhos do David Lynch)
sábado, 2 de janeiro de 2010
Se é preciso que se escreva um manifesto
Se é preciso que se escreva um manifesto (sobretudo quando ainda há juventude em nosso espírito, o que ainda nos é sinônimo de rebeldia) para entrar nos compêndios históricos, aqui vai o meu, ressaltando, porém, a falsa pretensão do seu autor em participar de tais anais.
Que seja abolido o espírito coletivo. Sou eu, antes de ser brasileiro. Sou tiago, antes de ser masculino. Calço quarenta e dois, antes de ser feliz. (Sabia, pela análise histórica, que a negação é parte primordial de um manifesto). A necessidade, natural (ao que parece), do serhumano se agrupar em bandos, e criando, com isso, essa defenestração dos sentimentos, naturais (ao que parece), chamada cultura gerou no mundo guerras e rivalidades. A fronteira só existe quando se define os seus conteúdos. (O preconceituoso negro que, tendo a frente duas coisas, chama uma de maçã e a outra de banana, não merece ser ouvido quando reclama que as outras coisas lhe chamam de negro, pois tendo a frente duas coisas a frente, eu duvido que uma banana (essa sim, livre de preconceitos) chamaria uma coisa de branco e a outra de negro).
Sou uma mistura de você com o seu vizinho. E com o meu. Não me defino, senão pelas minhas mensurações físicas, que são um pouco menos amorfas que meus pensamentos. Digo: cabelos negros (a luz do sol, sem que a química os colora, aviso logo), nariz de batatinha, mãos ligeiramente grossas (as luvas cabem-me na largura e sobram-me nos comprimentos), alguns centímetros de pênis e outros de orelha. Não sou nada que não sou, mas disso também não passo.
O português me veio como sobrevivência, o que faz tanta diferença quanto ter calçado sapatos chineses na infância, ou ter aprendido a usar os hashis apenas na adolescência, ou ter andado de trem em pirituba, ou ter andado de bicicleta em paris, ou ter nadado o atlântico atrás de um peixeboisereia que me encantou cantando em pentatônicas (ou hexafônicas, o que não faz, mesmo, diferença).
E com tudo isso, afirmo logo, somos uma profusão de coisas, de variáveis (vide obra aberta, do umberto eco (sim, na verdade, me considero uma grande obra aberta, assim como considero a quem lê isso (e a quem não lê também))), que me definir "homem", "brasileiro", "feliz", "machista", "viado", "bom vivão", na verdade, não diz nada. E reafirmo, sou antes de mim mesmo, apenas uma coisa que pensa ser quem eu sou.
Assim, para dar crédito a essas palavras e aguardar a sua fixação na história do mundo (se é que o mundo existe, já que aqui não se acredita mais em fronteiras, quiçá as intergaláticas), assino logo aqui, eu e meus outros eus, que são tão eu quanto eu, mas não passam de mim mesmo.
Tiago, músico
Tiago, viajante
Tiago, amante
Tiago, pedófilo
Tiago, comedor de bons sushis
Tiago, zagueiro
Tiago, cavalo
Tiago, cavalo-marinho
Tiago, dono do ticket velib nombre 8762040 válido jusqu'aujourd'hui
Tiago, nascido no ibirapuera, hospital do servidor público estadual
Tiago, que aprendeu a tocar violão comprando revistas do legião urbana nas bancas de são paulo
Tiago, que se criou em são paulo
Tiago, que se criou em pirituba
Tiago, que nunca foi ao capão redondo
Tiago, que não usa as letras maiúsculas para dizer os nomes próprios das coisas, senão seu próprio nome próprio
Tiago, que não usa pontosfinais. e que por isso poderia escrever para todo o sempre tudo aquilo que é, sem que, sequer, se atingisse a ponta mais próxima do âmago do seu ser
Que seja abolido o espírito coletivo. Sou eu, antes de ser brasileiro. Sou tiago, antes de ser masculino. Calço quarenta e dois, antes de ser feliz. (Sabia, pela análise histórica, que a negação é parte primordial de um manifesto). A necessidade, natural (ao que parece), do serhumano se agrupar em bandos, e criando, com isso, essa defenestração dos sentimentos, naturais (ao que parece), chamada cultura gerou no mundo guerras e rivalidades. A fronteira só existe quando se define os seus conteúdos. (O preconceituoso negro que, tendo a frente duas coisas, chama uma de maçã e a outra de banana, não merece ser ouvido quando reclama que as outras coisas lhe chamam de negro, pois tendo a frente duas coisas a frente, eu duvido que uma banana (essa sim, livre de preconceitos) chamaria uma coisa de branco e a outra de negro).
Sou uma mistura de você com o seu vizinho. E com o meu. Não me defino, senão pelas minhas mensurações físicas, que são um pouco menos amorfas que meus pensamentos. Digo: cabelos negros (a luz do sol, sem que a química os colora, aviso logo), nariz de batatinha, mãos ligeiramente grossas (as luvas cabem-me na largura e sobram-me nos comprimentos), alguns centímetros de pênis e outros de orelha. Não sou nada que não sou, mas disso também não passo.
O português me veio como sobrevivência, o que faz tanta diferença quanto ter calçado sapatos chineses na infância, ou ter aprendido a usar os hashis apenas na adolescência, ou ter andado de trem em pirituba, ou ter andado de bicicleta em paris, ou ter nadado o atlântico atrás de um peixeboisereia que me encantou cantando em pentatônicas (ou hexafônicas, o que não faz, mesmo, diferença).
E com tudo isso, afirmo logo, somos uma profusão de coisas, de variáveis (vide obra aberta, do umberto eco (sim, na verdade, me considero uma grande obra aberta, assim como considero a quem lê isso (e a quem não lê também))), que me definir "homem", "brasileiro", "feliz", "machista", "viado", "bom vivão", na verdade, não diz nada. E reafirmo, sou antes de mim mesmo, apenas uma coisa que pensa ser quem eu sou.
Assim, para dar crédito a essas palavras e aguardar a sua fixação na história do mundo (se é que o mundo existe, já que aqui não se acredita mais em fronteiras, quiçá as intergaláticas), assino logo aqui, eu e meus outros eus, que são tão eu quanto eu, mas não passam de mim mesmo.
Tiago, músico
Tiago, viajante
Tiago, amante
Tiago, pedófilo
Tiago, comedor de bons sushis
Tiago, zagueiro
Tiago, cavalo
Tiago, cavalo-marinho
Tiago, dono do ticket velib nombre 8762040 válido jusqu'aujourd'hui
Tiago, nascido no ibirapuera, hospital do servidor público estadual
Tiago, que aprendeu a tocar violão comprando revistas do legião urbana nas bancas de são paulo
Tiago, que se criou em são paulo
Tiago, que se criou em pirituba
Tiago, que nunca foi ao capão redondo
Tiago, que não usa as letras maiúsculas para dizer os nomes próprios das coisas, senão seu próprio nome próprio
Tiago, que não usa pontosfinais. e que por isso poderia escrever para todo o sempre tudo aquilo que é, sem que, sequer, se atingisse a ponta mais próxima do âmago do seu ser
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