duzentas mensagens. esse era o limite estipulado pelo meu aparelho celular para a caixa de mensagens sms. um celular médio, pensei, deve, portanto, ter uma capacidade média. pensando que pessoas médias como eu se relacionavam com pessoas ambamente médias, o aparelho dela também não devia ser muito diferente. dez por cento, pensei, dez por cento a mais ou a menos pode ser uma boa margem de erro.
comecei. "oi". não houve resposta. claro. insisti. "tenho saudades". devo seguir uma linha dramatúrgica, perguntei, pensando, ou apostar em fragmentos, perguntei novamente. mas eram duzentas mensagens, talvez duzentas e vinte. seriam mensagens suficientes para tentar muitos caminhos. "aquele dia foi muito bom". "você se lembra da cor da camisa do ciclistas que quase nos atropelou?"
a linha cômica pode funcionar, pensei, senão para obtenção de reposta, ao menos para conseguir um sorriso do outro lado. e um sorriso é sempre melhor que um amarro. "você e seu cabelo chanel". ela deve ter sorrido, pensei. mas. mas nada. apenas vazio.
"porque o rio que corre em mim". mesmo as besteiras mais sentimentais eram enviadas. incompletas. insolúveis. duzentas e vinte. duzentas e vinte duas, talvez. "tu és como um daqueles prendedores de cabelo de marfim". parnasiano demais, pensei. enviado, mesmo assim.
repetidos "oi"s. repetidos "eco"s. repetidos nadas.
"você lembra do pato?". "azul". "vermelho". "são paulo". "porque aquele dia eu queria você, porque aquele dia ia dar certo, porque aquele dia aconteceu"
mas num sistema comunicativo nunca há onipresença. e isso era torturante. ela teria batido a cabeça e desaprendido os códigos da língua portuguesa, pensei, perguntando. ou teria seu celular perdido a capacidade de decifrar o alfabeto romano, com seus acentos tupiniquins, sempre os acentos, malditos acentos. ela sorriria a cada terça menor descendente odiosamente tocada pelo aparelho chinês a cada mensagem recebida. ou ainda teria afogado o celular junto ao absorvente na privada, pensando, obviamente, não ela, mas eu.
ou pior. receberia ela duzentas outras mensagens doutro. sempre o outro, sempre a dúvida. uma caixa de entrada cheia de outro número, que não o meu. um único algarismo faria a diferença. eu em meu trono. eu em minha autocumplicidade. eu tão só.
"bem, duzentas e dezenove".
nada.
"fim"
sexta-feira, 4 de dezembro de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
vc escreve demais, sabia? mas é legal. porque é bom.
ResponderExcluireu sempre acho melhor ligar a mandar mensagens. respostas imediatas.
gostei desse, teago.
ResponderExcluirMuito bom.
ResponderExcluirMdm H.
ah, que coisa linda aquele link que você me mandou! achei sensacional!
ResponderExcluirmas me explica o que é? quem escreveu? de onde veio?
um beijo pra você. e continue escrevendo!
ah, eu adoro a hilda hilst. conheço pouquíssimas coisas (mesmo porque a obra dela é bem grande), mas já é o suficiente pr'eu gostar. (e acho que você também gosta, né? tem até citações dela por aqui!)
ResponderExcluirouvirei a peça sim, pode deixar, aí te digo o que achei.
e quanto ao audiopoema, eu conheço só de nome a marília garcia, mas agora deu vontade de ir atrás. é que o livro dela pela cosac/7 letras é da mesma coleção de um que ganhei de presente: "rilke shake", da angélica freitas.
acho que você vai gostar. tem um em particular que me atrai bastante, chamado "vida aérea".
um beijo!
esses fins de noites acabam nos levando pra dentro. tsc tsc tsc...
ResponderExcluirlindo, querido.
bjo.
abel.